Por Fernando
André Arruda, sociólogo.
As ruas ganham um novo colorido social na resistência democrática. Há
uma fermentação natural envolvendo esse novo cenário político, misturando
gerações, classes e raças, sem hegemonias de partidos tradicionais e
dominâncias de comando político identificável.
Talvez esse caráter inusitado da mobilização social anuncie uma
relativa autonomização dos movimentos sociais, movida mais por desejos
horizontalizados do que pelos velhos comandos verticais. Essa aparente
espontaneidade, unida pela vontade do "Fora Temer", tem como agenda a
defesa da democracia através de novas eleições. Essa chave é suficiente para
ascensão de um amplo movimento de mobilização social, capaz de abalar a
tranquilidade da elite golpista.
O protesto de Sete de Setembro na orla da praia de Fortaleza foi
marcado por uma irreverência alegre e pacífica. Na caminhada pelas ruas do
bairro nobre da cidade, ornamentadas por prédios de opulência luxuosa, os
manifestantes eram desafiados, em diversos momentos, por agressões verbais,
cartazes e bandeiras remanescentes do movimento "Fora Dilma". As
provocações animavam as chamas de resistência, fazendo ecoar as palavras de
ordem " Fora Temer", "Fascistas, não passarão", sem nunca
descambar para atos de violência física ou qualquer atitude de depredação dos
bens públicos ou privados. E isso porque no percurso da caminhada existiam
lojas de bancos e revendedoras de carros, símbolos frequentes onde se despejam
as iras dos indignados.
Existia forte era o destemor na defesa da democracia, estampados no
rostos pintados de uma juventude de estudantes, das classes médias e
periféricas, que inundavam as avenidas desertas de carros. Em todo o trajeto
inexistia qualquer policiamento, nem militar e nem de trânsito, sendo os
próprios caminhantes que sinalizavam a interrupção das vias, sem necessidade de
conter qualquer impulso de vandalismo, já que inexistente.
Enquanto existia as provocações de alguns moradores do bairro nobre,
destilando o seu ódio das janelas e sacadas dos seus prédios, verdadeiras
fortalezas medievais, cercadas de muros e grades, além de abundante segurança
privada, não faltaram solidariedade advindas de varias janelas de prédios mais
simples e sacadas distantes dos espigões de cimento e vidro, onde se anunciavam
o entusiasmo das mãos e bandeiras vermelhas a se agitarem em sintonia de
vontades. Além da buzina de caminhões e carros que faziam coro a indignação das
ruas em movimento. Essas manifestações agitavam os espíritos e impulsionava a
certeza da alegria de lutar. As vozes se fortaleciam e as bandeiras tremulavam
com mais vigor.
Quem caminhou nessa festa de resistência pacífica sentiu a força e a
coragem de 20 mil corações pulsantes em defesa da democracia; onde conviviam velhos
e crianças enlaçados na correnteza de uma juventude destemida.
Por isso, é lastimável e imperdoável a truculência da polícia militar,
do ronda do quarteirão e do raio, em promover uma violência injustificável
contra o direito sagrado da manifestação democrática. Num ato de covardia,
atacando após dispersa a mobilização, pequenos grupos que relaxavam após a
caminhada, com ataques indiscriminados de balas de borrachas, spray de pimenta
e violência física.
É uma vergonha que em um governo do PT ocorra cenas tão bizarras.
Também é certo a existência de um comando que atiça a repressão e tenta
provocar o tumulto na busca de intimidar as manifestações que tendem a se
ampliar em todo o país.
As ruas tornaram-se no último refúgio da defesa democrática e do
combate ao retrocesso dos direitos sociais e trabalhista no país.
Portanto, a única coisa que cabe ao governador do Ceará é punir os
abusos e excessos de sua polícia, antes de ver, além do esvaziamento de sua
credibilidade pública, com a ampliação de sua rejeição popular, também
evaporado os resquícios de sua autoridade diante das forças policiais.
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