Carta aberta à ministra Carmen Lúcia, do STF
Prezada Ministra Carmem Lúcia
Nosso País acordou estupefato com a
prisão de um senador da República. Por outro lado, alivio-me com a
prisão de um banqueiro, um dos mais ricos do Brasil.
Não guardo intimidade com o pensamento
do Senador Delcídio do Amaral em virtude de suas origens políticas,
ligadas à privatizações e ao nefasto neoliberalismo. Porém, sua prisão
nos coloca sob espanto pelo colorido de arbitrariedade em face da
imunidade parlamentar de que gozam os eleitos pelo povo para ocupar
cadeira na mais alta casa legislativa.
Perdoe-me, ministra Carmem, por me
dirigir a senhora sem o traquejo jurídico próprio dos advogados, já que
não sou um e sem a formalidade de um tribunal, já que não pertenço a
nenhum.
Aqui tenho o objetivo de questioná-la
pelo que disse na 2ª turma do STF ao justificar seu voto na decisão do
ministro Teori Zavascki ao ordenar a prisão do Senador Delcídio do
Amaral e do Banqueiro André Esteves.
É de se esperar que os homens e as
mulheres eleitos e eleitas sejam honestos, honestas, probos e probas nas
suas atividades parlamentares, embora alguns afrontem e desrespeitem a
sensibilidade social e a cidadania, como é o caso do Senador Ronaldo
Caiado, que frequentemente usa camiseta amarela com os sinais de 9
dedos, em deboche a deficiência física do ex-presidente Luiz Inácio Luiz
da Silva, sem que seja incomodado em momento algum por esse preconceito
e crime.
Nesta carta singela desejo lhe dizer que
me senti ofendido e desrespeitado como cidadão com seu discurso ao
justificar seu voto a favor da prisão de Delcídio do Amaral, nesta
manhã.
A senhora disse que antes nos fizeram
acreditar que a esperança venceu o medo. É evidente que a senhora se
referiu à campanha eleitoral e eleição do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, sem citá-lo.
E vencemos mesmo, ministra Carmem.
Milhões de brasileiros fomos ameaçados com o estouro do dólar, com a
fuga dos empresários que investiriam em outros Países abandonando o
Brasil ao desemprego e à pobreza. Uma atriz da TV Globo apareceu em
noticiários e na propaganda eleitoral do PSDB fazendo caras teatrais de
assustada e dizendo: “ai, estou com medo”. Pois vencemos essa tentativa.
Os milhões de votos investidos em Lula transcenderam fronteiras
partidárias para afirmar nossa esperança contra as ameaças rasteiras e
desonestas. Vencemos o medo, com muita esperança. O Brasil se sentiu
recompensado com essa vitória. A senhora sabe!
Como cidadão e como povo me sinto
ofendido e agredido em minha esperança e em minha fé com essa sua fala,
para mim irônica e sem nenhuma relação com o mensalão da mídia, com
muitos casos dúbios e influenciados pela opinião publicada.
A senhora carregou sobre a ironia sem nexo ao afirmar que “agora o escárnio venceu o cinismo”.
Qual a relação do possível crime do
Senador Delcídio do Amaral, nem investigado totalmente e, muito menos
julgado e condenado, com a vitória da esperança em 2002?
A senhora quer nos envolver em todos os
possíveis crimes de Delcídio? A senhora falou pensando em investigação e
condenação do ex-presidente Lula, o candidato a respeito de quem se
usou o slogan “a esperança venceu o medo”? A senhora já sabe, mesmo sem
julgamento, que o Senador Delcídio do Amaral é criminoso, até mesmo
antes da manifestação da casa onde ele é parlamentar?
Na fundamentação de seu voto a favor da prisão do aludido senador a senhora asseverou que “ agora o escárnio venceu o cinismo”.
Pergunto se o seu voto não se referia a
um senador? Se se referia ao Senador Delcídio do Amaral qual a relação
da ironia com os votos de milhões de brasileiros que tiveram esperança
de mudar aquela realidade triste de desemprego, de miséria e de pobreza
em 2002?
A senhora ameaçou quem ao afirmar
posteriormente que “criminosos não passarão sobre a justiça”, alertando a
todos do mundo da corrupção?
Perdão, ministra, mas a minha ofensa
também vem do fato de a senhora misturar ironicamente fatos e valores
sem nenhuma relação, sendo que a esperança realmente venceu o medo e
sempre vencerá as vilanias da classe dominante, principalmente da
rapinagem dos poderosos internacionais, que atuam por meio de jagunços
nacionais.
Pior, a sua referência de falso senso de
oportunidade choca por estabelecer nexos irreais entre um senador
atual, preso acusado de atrapalhar investigações, com toda a força da
esperança de um povo.
Choca mais o fato de a senhora não fazer
nenhuma menção ao banqueiro André Esteves, dono do Banco BTG Pactual,
também preso como suspeito de fazer uma operação polêmica na área
internacional da Petrobras, ao comprar poços de petróleo na África,
sendo ele um dos homens mais ricos do Brasil, um País pobre e, mesmo
assim, de esperanças que vencem os medos.
A senhora não disse nada sobre André
Esteves foi pelo fato de ele ser banqueiro e rico? Haveria na senhora
algum senso de seletividade, como o há na mídia que reforçou com grande
destaque as suas palavras?
Enfim, perdoe-me pela ousadia de exercer
o direito de questionar, de me indignar contra as seletividades e
contra o deboche em relação ao povo que tem esperança, apesar do medo
que diuturnamente lhe impingem.
Abraços críticos e fraternos na luta pela justiça e pela paz sociais.
Dom Orvandil, OSF: bispo cabano, farrapo e republicano, presidente da Ibrapaz, bispo da Diocese Brasil Central e professor universitário, trabalhando duro sem explorar ninguém.
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